Contra a discriminação II
Li com curiosidade e interesse todos os comentários que recebi no post abaixo sobre discriminação racial. Resolvi concentrar o meu post sobre discriminação racial porque inicialmente foi esse o intento da ONU quando decidiu designar essa data para marcar um protesto que ocorreu na África do Sul em 1960 no qual 69 morreram e mais de cem ficaram feridos. Também acompanhei o quanto pude o que outros blogueiros escreveram a respeito.
Foi bom ver tantas pessoas inteligentes e engajadas expressando suas opiniões. A minha impressão foi que há um consenso geral que a discriminação, seja ela qual for, é um crime.
Eu decidi explorar a questão do privilégio porque acredito que é muito mais difícil para nós examinarmos os diversos níveis de privilégio que desfrutamos que apontar as injustiças sofridas por outros grupos. Creio que isso coloca as pessoas numa posição incomôda porque ninguém quer ser taxado de racista ou se sentir culpado por algo que não temos nenhuma escolha, como a cor da pele.
No entanto, eu acho imperativo que as pessoas reconheçam os seus “privilégios.” Na minha opinião, não reconhecê-los de certa forma legitimiza a posição do privilegiado como algo natural e neutro, e assim sendo nos isenta de qualquer responsabilidade. De certa forma, o privilégio passa a ser visto como uma coisa normal que não precisa ser questionada.
Concordo com quem diz que raça só existe uma, a humana, como algumas pessoas disseram nos comentários abaixo. Acredito que essa seja uma posição ética, moral, nobre e ideal. No entanto, alguém só pode ignorar “raça” quando está não lhe afeta. Para aqueles que ouvem piadas racistas, que são tratados de maneira diferente por causa da cor da sua pele, que têm seu acesso barrado em prédios, universidades e emprego, “raça” é uma realidade concreta que não vai desaparecer porque acreditamos estar acima dessa mesquinharia. Quando a minha filha chega da escola aos quatro anos de idade e me diz que uma amiguinha disse que a cor da pele dela é “marrom como a lama” enquanto que a dela é rosada como uma pétala de rosa, dizer que só existe uma “raça,” a raça humana, simplesmente não cola. Esse tipo de comentário, embora sincero e bem intencionado, a meu ver minimiza a questao do racismo e contribui para o mito de que no Brasil existe a “democracia racial.” Basta ver as condições sociais da maioria da população afro-descendente no Brasil, a falta de representação na política, nos meios de comunicação, nas universidades para sabermos que nossa misceginação harmoniosa não passa de cartão postal.
Outro elemento comum que encontro nesse tipo de discussão é a comparação entre os Estados Unidos e o Brasil e como o racismo é infinitamente pior aqui que no Brasil. É claro que os Estados Unidos tem uma história brutal e recente no que diz respeito ao racismo. No Brasil nunca houve linchamentos, pelos menos não eram sistematicamente apoioados pelo Estado como nos E.U.A. O Brasil também não teve de lidar com leis que pregavam a segregação nas escolas ou condenavam o casamento interacial. Mas o movimento negro nesse país tem uma longa tradição de luta pelos direitos civis. Embora o racismo aqui esteja alive and well já se pode falar numa classe média afro-americana e eu garanto que o número de afro-americanos nas universidades daqui proporcionalmente em relação ao resto a população é maior do que o que vemos no Brasil. É verdade que aqui as comunidades são segregadas e as consequências econômicas geradas pelo racismo são óbvias.
Entretanto, o mesmo acontece no Brasil, mas pouca gente tem coragem de desbancar o mito. É bonito exaltar a nossa “mistura de raças” e a imagem de todo mundo vivendo junto em harmonia até que sua filha decida se casar com um “negão.” Estou falando de experiência própria, quando aos 17 anos me apaixonei por um homem negro e a minha mãe não entendia como “isso podia ter acontecido,” embora ela nunca tivesse me dito que eu não deveria ter amizade ou brincar com crianças negras. Imagino que como muitos brasileiros, ela provavelmente também teria dito: “não sou racista, tenho até amigos negros,” sem se dar conta de como esse comentário em si já é racista. Ainda bem que as pessoas mudam e quando chegou a vez do meu afro-deustche ela já tinha “aprendido.”
Voltando aos privilégios, quero aqui humildemente reconhecer os meus: sou brasileira-latina-imigrante-multiracial, mas tenho a pele morena e falo inglês muito bem; tenho curso universitário; morro em um bairro seguro onde não ouço tiroteio à noite (isso também acontece em país rico); sou heterosexual, o que significa que pude me casar com a pessoa que eu amo e posso andar de mãos dadas em público sem medo de ser agredida; não sou soro positivo ou portadora de nenhuma deficiência
Então, acho que reconhecermos o nosso próprio privilégio já é um primeiro passo. Não se trata de apontar o dedo acusatório para o nariz de ninguém. Trata-se somente de assumirmos a nossa parcela de participação, voluntária ou não, nesse processo. Com o reconhecimento, acredito nasce a empatia e por fim solidariedade e irmandade.
PS: Como já disse o Lino na caixinha aí embaixo até WASP (White Anglo Saxon Protestant) e republicano pode sofrer discriminação. Well, everybody hurts, sometimes!
Brincadeiras à parte, ninguém deve ser discriminado. Em nome da diversidade que eu tanto aprecio, nem mesmo os republicanos.
9 Comments:
Re, pra variar, este post está sensacional! :-) Um prazer ler um texto tao lúcido e tao bem escrito!
Vanessa,
Muito obrigada!
Bjs.
Regina
Regina,
Receio soar como um eco dos outros comentários, mas os teus posts sobre a discriminação racial estão um 'show'. Os teus argumentos estão articulados com muita propriedade e lógica. Se eu desse aulas sobre racismo, pediria p/ os meus alunos lerem os teus depoimentos.
Eu não tenho absolutamente nada a discordar de você -- aliás, tenho que dizer que aprendi muito c/ os teus dois posts e, inclusive, mudei um pouco a minha perspectiva sobre o assunto. É consenso antropológico que raça é uma noção 'inventada' e exaurida. Sim, é verdade, uma vez que foi determinado que todos viemos da África e fomos nos infiltrando em outros continentes e nossas peles e corpos foram respondendo às novas condições do meio-ambiente. No entanto, como você bem argumenta no post abaixo, a noção de raça é válida para discutir a questão da discriminação. Eu me insiro no grupo dos privilegiados pois moro no Brasil, sou 'branca' e casada com um homem branco (aliás branquinho demais! hehe). A minha situação iria mudar drasticamente se eu morasse nos E.U.A., por exemplo. Aliás, deixe-me contar (a você e os teus leitores) uma situação desagradável pela qual eu passei quando morava na Inglaterra. Eu namorava um inglês e um dia escutei ele comentando com um amigo (que havia ficado curioso com a minha pronúncia e aparência) que eu "apenas morava no Brasil" e tinha nascido na Itália. Pois é, na inocência dos meus 20 anos, mandei o namorado pastar e nunca mais voltar. Eu fiquei furiosa. Como falei no meu comentário no blog da Denise (hoje, domingo), não sei como me se sentiria se sofresse esse tipo de atitude freqüentemente. Tenho certeza que o comentário que a tua filha fez, por exemplo, me deixaria muito chateada.
E concordo com você: a questão do racismo no Brasil está alive and kickin'! Infelizmente, os movimentos afro não têm a mesma visibilidade que os americanos. E isso revela o descaso da nossa sociedade frente às nossas raízes africanas.
[Parece que está chovendo canivetes aqui. Ou que o mundo está desabando]
beijocas,
Cris
Cris,
Muito obrigada pelo elogio e pelo apoio. Nao sei como seria com voce aqui nos E.U.A. Acho que talvez por voce ter a pele mais clara e falar ingles muito bem nao sofreria discriminacao com tanta frequencia. Quando estamos em um grupo de brasileiras gostamos de comparar as nossas estorias. As de pele mais clara "blend in" com mais facilidade. Tambem dependeria muito de onde voce fosse morar.
Na verdade, mesmo tendo a pele mais morena nao posso dizer que sofro discriminacao com frequencia. Acho que no meu caso, isso tambem se deve a minha abilidade de me comunicar bem na lingua (embora com sotaque). Quero ressaltar aqui que o preconceito existe entre todos os grupos sociais. Eu, por exemplo, ja fui alvo de remarcas racistas por parte de outras pessoas nao-brancas. Ainda vou escrever mais sobre isso.
Bjs.
Regina
Cris,
Putz, escrevi "abilidade" sem o h porque estava com receio de que se escreve com h so em ingles (hability). Doidices de quem vive entre varias linguas, he,he,he
Bjs.
Regina
Keep up the good work.
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