Viva Zumbi dos Palmares
Nesse país muita gente ainda acredita no american dream, que se alguém não se dá bem na vida é porque essa pessoa não batalhou o suficiente. Raramente a injustiça social é vista como um fruto da desigualdade entre as classes. Os problemas sociais são geralmente atribuídos às questões de raça. Acabei de ler um artigo no New York Times falando da discrepância no desempenho escolar entre crianças brancas e crianças negras e latinas. Mas em nenhum momento, o artigo fala sobre a intersecção entre raça e classe social. É verdade que existe afro-americanos e latinos de classe média, mas as pessoas morando nos guetos das grandes cidades são em sua grande maioria negros e latinos. Em contrapartida, nos subúrbios onde as escolas públicas são imaculadas e tão boas como as escolas particulares e os moradores tem um nível de educação mais alto e, consequentemente, maior poder aquisitivo, o número de pessoas latinas e afro-americanas que ali moram é baixíssimo.
No Brasil, por outro lado, ainda existe gente que acredita no mito da democracia racial. É óbvio que o racismo existe no Brasil. Ele está em toda parte: nas novelas, nas famílias, nas “entradas de serviço,” nas piadinhas e comentários racistas, na exclusão de afro-brasileiros na política, nas universidades e nas posições de poder. Mas eu acredito que racismo e classismo são interconectados. Na minha opinião não há como lidar com um tipo de opressão sem questionar o outro. Acredito que medidas como a adoção do sistema de cotas pode ser beneficial até um certo ponto mas não muda os problemas estruturais de uma das sociedades mais desiguais do mundo.
O reconhecimento de que a sociedade brasileira é uma sociedade racista é sem dúvida um primeiro passo, mas também é necessário reconhecer que a sociedade brasileira é classista. É necessário reconhecer que muitas das pessoas que conseguem entrar nas universidades gratuitas e de prestígio como a USP tiveram a oportunidade de estudar nos melhores colégios particulares de São Paulo.
Voltando ao exemplo do New York Times de hoje, não é o suficiente ter professores bem treinados, ter computadores nas escolas, exigir rigor nos testes se tem alunos que não tem o que comer em casa, se tem alunos que vivem em bairros cheios de traficantes e gangues, se tem alunos cujos pais estão na cadeia ou outros que já viram a morte de perto.
Tanto aqui quanto no Brasil, a segregação é brutal. A miséria é prima-irmã do racismo. Eu moro num bairro arborizado de classe média (artistas, professores universitários, advogados, etc.) onde a maioria é branca, com alguns outros gatos pingados como a minha família. O meu marido aluga um estúdio para o trabalho dele numa área há quinze minutos de onde moramos. Lá não há um supermercado por perto, somente botecos. Em contraste, no meu bairro tenho a opção entre dois supermercados diferentes sem contar a mercearia da esquina e uma padaria que também vende queijos. A cena nesse outro bairro é deprimente: prostituição, tráfico de drogas, há de tudo. Mas dá para contar nos dedos de uma mão quantas pessoas brancas você vê por lá. Somente alguns artistas ou yuppies que estão mudando para os condomínios novos que estão sendo constuídos nas áreas mais desoladas da cidade. Mas isso já é outra história.
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Denise do Sindrome de Estocolmo
Ana Lucia do A(n)anima
8 Comments:
Oi Regina.
Eu nem gosto muito de falar sobre este assunto. Aqui em Portugal dá pano para mangas. Tivemos colónias em África até 1974 e depois da guerra colonial, virou-se o feitiço contra o feiticeiro. Hoje até já temos os filhos e os netos desses africanos que vieram para cá pós-guerra.
Na minha família, digo os meus pais, nunca houve problemas em relação a racismo. Mas quando arranjei um namorado de cabo verde, as coisas mudaram um pouco de figura. Não digo que fosse racismo. Foi mais a tal diferença entre classes. Negro em Portugal é sinónimo de trabalhador das obras. E os meus pais não queriam a filha professora com um pé rapado... É claro que a história não ficou por ali. Mas como as paredes têm ouvidos...
Beijos.
Regina,
Excelente o teu post. Sempre acreditei que o problema social principal do Brasil está entre as classes sociais. Falo isso primeiro por experiência. Apesar de vir de família branca (em termos de cor, porque em termos de raça, quem é que sabe ao certo mesmo se afinal somos todos, brasileiros, uma mistura?), sempre fomos pobres, e por conseqüência a discriminação estava sempre nos atingindo duramente.
Sou a favor do sistema de cotas porque, como disse lá no blog da Denise, é um começo que o Brasil faz para encarar o problema que existe. Mas também acredito plenamente que não é por aí que se resolve o problema de vez, mesmo porque está enraigado na cultura brasileira; que é a questão do senhor e do serviçal. Questão de poder. Uns mandam e outros obedecem.
Quanto ao racismo nos Estados Unidos, o que tenho a dizer que é diferente e muito diferente do do Brasil. Às vezes é mais evidente, às vezes é muito mais agressivo,e isso choca muito, mas também a necessidade de se isolar aqui nesse país vem, me parece, de ambas as partes. Lamentável. Todos querem "ser diferentes", por isso o racismo a ser combatido aqui está mais à base do indivíduo do que do coletivo, eu penso.
Sempre digo que não dá para tratar o racismo do Brasil nos mesmos termos que se trata o racismo do USA. Vejo que há algumas pessoas que querendo mudanças caem na armadilha de copiar as ideologias norte-americanas e tentar aplicá-las ao Brasil. Não funciona.
Bom post!
Sofia,
Nao e' so em Portugal que isso da pano para mangas. No Brasil tb. Quanto a familia, eu tb pensava que meus pais nao fossem racistas ate que eu me apaixonei por um homem negro. E olha que a meu ver eu sou mestica.
Beijos,
Regina
Anita,
Eu tambem nao acho uma boa ideia "importar" a ideologia do movimento negro americano para o Brasil e aplica-la sem levarmos em conta o contexto historico e social especifico do Brasil. Embora eu concorde em principio com as cotas nas universidades, eu tenho receio que isso nao vai funcionar. Quem vai definir quem e' negro no Brasil? E as pessoas de descendencia africana mas com a pele mais clara?
Tambem concordo com voce que a questao racial no Brasil passa por uma relacao de poder: quem e' o mestre, quem e' o servical. Ainda hoje, as empregadas domesticas sao tratadas como escravas assalariadas. E nao e' coicidencia nenhuma que a maioria delas sao mesticas ou negras.
Quanto ao classismo no Brasil, eu acho afeta a todos que sao pobres independente da cor da pele. E' claro que eu posso argumentar que quanto mais clara a pele, maior o privilegio (como se diz aqui)e a facilidade de mover na sociedade sem tanta discriminacao. Mas pobreza e' pobreza!
Beijus,
Regina
Regina,
Muito prazer.. meu nome é Renata, moro no Brasil mesmo e adooro blogs.. e é uma rede mesmo néh... cê vai indo, pulando pra cá e pra lá.. e de repente encontra uma coisa que vale a pena.. como o seu diário..
gostei mesmo...
agora..., me explica uma coisa, não quero parecer arrogante por favor mas, quando vc diz "tráfego de drogas" é tráfego mesmo (no sentido de "rota") ou foi uma pequena confusão (eu entendi "tráfico") pelo fato de vc estar longe de sua pátria natal?!
um abraço..
vai ser um prazer continuar te lendo.. (já favoritei!)
qualquer dia eu faço o meu (blog).. talvez qdo tiver um leve pico de auto-estima, já que penso que não tenho coisas mto interessantes a dizer..
+ um abraço!
Oi Renata,
Seja bemvinda! Voce nao foi arrogante, nao, muito pelo contrario. Realmente foi um erro de minha parte. Obrigada por ter me avisado. Se notar mais algum erro por favor fique a vontade para me corrigir.;-)
Beijos,
Regina
Oi Renata,
Seja bemvinda! Voce nao foi arrogante, nao, muito pelo contrario. Realmente foi um erro de minha parte. Obrigada por ter me avisado. Se notar mais algum erro por favor fique a vontade para me corrigir.;-)
Beijos,
Regina
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