Com o passar do tempo

O passar do tempo tem me feito mais contemplativa e até mesmo mais sábia, o que não significa necessariamente ajuizada. Na verdade, meus olhos distraídos estão sempre deixando-se levar por coisas efêmeras como um olhar, um rabisco no chão, um detalhe qualquer, uma promessa no ar.

Mas isso tudo não vem ao caso. Quero nesse momento falar sobre muralhas. Não estou me referindo às muralhas de concreto, mas sim às muralhas invísiveis. Dias antes do meu aniversário, eu tive uma crise de choro no chuveiro que demorou a passar. Chegou assim, sem mais nem menos, após uma tarde onde tudo parecia tão bem: a luz, a estrada, a companhia. Talvez tenha sido o inferno astral, embora eu não saiba nada sobre astrologia. Mas acho que foi mesmo uma das minhas muralhas desmoronando.

Descobri recentemente que tenho um talento invejável para construir muralhas invisíveis. As minhas muralhas são tão sutis que às vezes nem eu mesma as percebo. Aprendi a construí-las no decorrer dos meus tantos adeuses. Elas me protegem da distância, da saudade, do medo que sinto da minha própria vulnerabilidade e da eventual perda.

A minha muralha é o meu escudo de guerreira sempre alerta. Mas não faz bem para a saúde andar sempre empunhando um escudo. Muitas vezes o esforço requerido para construir e manter a façada é muito maior que para desmoroná-la. Continuarei prosseguindo com cautela, mas daqui por diante questionarei mais a necessidade das minhas muralhas.