Saturday, December 29, 2007

A Cida Louca e o espírito natalino

Uma hora da manhã. Tem chovido e feito muito frio. A cidade está coberta por uma neblina fria. Em noites como essa o fulano que lê a previsão do tempo recomenda que os bichos durmam dentro de casa. No entanto muitos homeless estão dormindo nas portas das lojas do meu bairro, algumas delas boutiques com vitrines lindas e iluminadas repletas de sapatos e roupas elegantes. É tão “normal” que até eu me sinto de certa forma imune à cena. Eu sinto compaixão, mas mantenho o meu coração e a minha carteira a uma certa distância. O coração fica em resguardo porque me sinto impotente diante de tanta miséria humana e a carteira, bem a carteira, não me sobraria nada.

Eu ainda me lembro como fiquei chocada logo que cheguei nos Estados Unidos e vi pessoas pedindo esmola nas ruas. Eu jamais imaginara que isso fosse possível no país mais rico do mundo. Eu tinha apenas 23 anos e a cabeça repleta de imagens de casa com lareira e de bairros arborizados e sem cerca (tudo ao som de Burt Bacharach, é lógico). É claro que além de Family e The Waltons eu também tinha assistido Shaft, Kojak e Os Detetives e vistos cenas no Harlem, mas nada tinha me preparado para o meu primeiro encontro com a pobreza a la Tio Sam.

A número de pessoas vivendo nas ruas aumentou muito desde de que eu vim morar aqui. A situação piorou durante o governo de Ronald Reagan, cuja administração diminuiu as verbas para os serviços públicos. Oito anos de Bush só vieram a piorar as coisas. Muitos homeless sofrem problemas psiquiátricos e os que não sofrem inicialmente correm o risco. É comum ver pessoas idosas e veteranos da guerra do Vietnam, mas também existem famílias com crianças que se tornam homeless porque um dos pais perde o emprego.

Eu moro num bairro cercado por restaurantes e lojas, por isso é também uma área que atrae muitos homeless. É surreal ver as pessoas carregando sacolas de boutiques elegantes e dirigindo carros caros ao lado de pessoas empurrando carrinhos de supermercado com todos os seus pertences.

No ano passado uma moça jovem começou a “morar” na minha rua. Na esquina há um café e uma espécie de galeriazinha com outras lojas. Ela geralmente dorme por ali quando tudo está fechado. Uma noite ela estava tossindo tanto que eu pensei que talvez ela tivesse tuberculose. Pensei em chamar a polícia mas não queria lhe causar mais problemas ainda. Finalmente, eu me lembrei da mãe de um menino que foi à escola com a minha filha que trabalha como psicóloga no Departamento de Saúde Mental de Berkeley. Ela me disse que da próxima vez eu devo telefonar para lá.

Essa mesma moça passa o dia caminhando pelas ruas e alucinando. Ela às vezes bate altos papos com a minha gata. Eu tenho a impressão que ela é esquisofrênica. O comportamento dela é completamente imprevisível. Um dia ela conversa com os meus filhos, no outro ela faz um gesto obsceno. Agora os meus filhos têm medo dela.

Isso me lembra da Cida Louca. A Cida Louca, era assim que a chamávamos que eu era menina, era uma mulher com problemas mentais que morava no meu bairro. Um dia eu corri para dentro de casa porque a Cida Louca estava correndo nua rua abaixo e gritanto.

Que tristeza! Fico imaginando a solidão dessas pessoas que vivem perdidas entre dois mundos, com a alma atormentada e sem paz de espírito. E muitas delas sem nem um teto!

Foto: Carrinho estacionado em frente ao Longs hoje por volta das oito da noite.

5 Comments:

Blogger Andréa said...

É triste mesmo, e a gente não sabe o que pode fazer. Quando eu era pequena tinha medo do Zé Pinguinha. Ele era um bêbado que morava umas duas ruas atrás da chácara dos meus pais, em Ribeirão Pires. E ele era até casado e tinha 2 filhos, que brincavam comigo- eu adorava eles. Mas morria de medo do pai deles porque quando bêbado ele andava pelas ruas falando alto, xingando... eu tinha até pesadelo. Um dia ele foi atropelado na estrada ali perto.

7:07 AM  
Blogger Andréa said...

Continuando meu comentário...

Ele foi atropelado e morreu. A esposa se mudou com os dois filhos e eu nunca mais tive pesadelos. Fiquei morrendo de pena daquela família. E de saudade das crianças.

7:09 AM  
Anonymous Anonymous said...

É um contraste muito grande mesmo. A gente tem que fazer o que pode - doar para as famílias mais pobres, contribuir para as organizações de ajuda aos homeless.

Bem, feliz Ano Novo pra vocês!!!

7:52 PM  
Blogger oakleyses said...

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7:15 PM  
Blogger oakleyses said...

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7:27 PM  

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