Friday, August 17, 2007


Burrocracia

Era para eu estar no Brasil, mas só me sobrou ficar aqui, California dreaming. Eu estava de viagem marcada para o dia 8 de agosto. Faz dois anos que meus filhos não vêem a avó, os tios e os primos.

Eu tive que renovar o passaporte da minha filha. Mandei o formulário há seis semanas e paguei $100 a mais para ter o passaporte expedited entre duas e quatro semanas. Quando faltava uma semana e meia antes do meu vôo eu comecei a telefonar para a Central de Passaportes que fica em New Hampshire, do outro lado do país. A mulher do outro lado do telefone disse que estavam fazendo o passaporte, mas que por via das dúvidas eu deveria tentar marcar uma hora para ir ao escritório em San Francisco. É claro que não havia ninguém com quem eu pudesse falar em pessoa. Somente o de sempre: para isso aperte esse número, para aquilo aperte aquele número. Eu detesto esses sistemas de vozes automático.

Continuei telefonando todos os dias e sempre a mesma resposta: your application is being processed, mam! Eu odeio a expressão mam, que vem de madame. A intenção do termo é demonstrar respeito e educação. Até aí tudo bem. Mas acontece que esse termo é geralmente utilizado por burocratas num tom condescendente quando eles não sabem como responder a sua pergunta e querem se livrar de você.

Finalmente, quando faltava cinco dias para o embarque, um tipo falou que eu podia ter um appointment de emergência no escritório em San Francisco. Mas tinha um porém. O pai dela tinha de estar presente. O problema é que ele estava na Alemanha a trabalho. O tipo então disse que ele teria que me mandar uma tal forma com firma reconhecida via fax. Ele estava lecionando num castelo no meio de uma floresta no meio da Alemanha sem acesso a telefone ou internete.

Eu expliquei que ele estava presente quando preenchemos o formulário e já havia autorizado e assinado na frente da pessoa com a qual aplicamos pelo passaporte. Mas não há exceção quando se trata da burocracia. A burocracia é inflexível. A burocracia é burra.

Decidi então que eu iria arriscar e viajar com o passaporte brasileiro dela e o pai poderia me mandar o americano quando este chegasse. Como ela tem dupla cidadania, ela entra no Brasil com o passaporte brasileiro e entra aqui com o americano. Eu estava de malas prontas, prestes a sair para o aeroporto quando decidi telefonar mais uma vez para o escritório central na esperança de ouvir que o passaporte estava prestes a ser enviado.

Muito pelo contrário, a voz do outro lado disse: there seems to be a problema with the application, mam! Quando perguntei qual era o problema ela não soube responder. Quando perguntei se ela poderia contatar o escritório em San Francisco para descobrirmos qual era o problema, ela disse que não. Só podia contatá-los via e-mail!

Após mais de uma semana vivendo um cenário digno de Kafka, eu estava a ponto de sofrer um ataque de pânico. Fiquei pensando o que poderia haver de errado com o formulário. Teria esquecido de colocar as fotos, a certidão de nascimento? Enfim, sem saber qual era o problema não era prudente eu me arriscar com as duas crianças. Telefonei para a companhia área para cancelar a passagem. Eles não reembolsam. Poderei usar as passagens dentro de um ano, mas terei que pagar uma multa altíssima. Tive que cancelar as passagens entre São Paulo e Floripa também. O lado brasileiro pelo menos foi mais generoso e tive de pagar somente 30 reais por passagem para o cancelamento.

No dia seguinte eu telefonei mais uma vez e dessa vez eles me disseram que o passaporte estava pronto. Um dia após minha última conversa com o burrocrata, o passaporte dela chegou: azulzinho e novinho em folha. Não havia nenhum problema.

Passei uns dias na maior deprê, uma mistura de tristeza e raiva. Estou triste por ter de adiar a minha viagem até o ano que vem. Estou furiosa por ter de pagar pela incompetência desse governo.

Eu não me considero uma pessoa superticiosa, em geral. Mas o único consolo que me resta é pensar que talvez não era para ser. Dar muro em ponta de faca por muito tempo pode acabar em sangue.

Fotos: (1) Berkeley Marina, (2) Stinson Beach na tarde de quinta-feira.

10 Comments:

Blogger Ana said...

Poxa Regina, é muito chato isso que aconteceu. Eu odeio burocracia, fico doida. Mas olha, você foi prudente e fez muito bem, é isso que tem que pensar. E tudo tem sua hora, o fato de você ficar aqui pode também ter a sua serventia. Eles nao deixariam a sua filha sair sem o passaporte americano. Qdo eu sai da ultima vez, eles pediram pra ver os dois passaportes, mesmo se na entrada e na saida do Brasil, eles pediam soh o brasileiro. Na chegada aqui, é claro, eles pediam o canadense. Querida, a viagem no ano que vem vai ser muito melhor, e você vai recuperar a grana perdida de outro jeito viu ? Beijos solidarios.

6:12 AM  
Anonymous Anonymous said...

Regina,
Você foi absolutamente sensata na tua decisão. Deixe passar esse auê dos aerportos e depois você decide o que fazer. Adorei a expressão burrocracia, pois é isso mesmo que essa multidão burra de papéis e procedimentos nonsense é. Tal qual você, eu quase tive um ataque de nervos esperando a resposta do Consulado americano em São Paulo em julho passado. Eu agora tenho que renovar os nossos vistos e, ainda que eu seja casada com um americano, só de pensar na papelada ridícula que eles exigem, eu tremo (de raiva) porque eles tratam todos como ilegais em potencial. Nem quero saber do visto permanente, apesar de ter todo o direito.

Você já pensou que no verão pode ser muito melhor? O inverno tem sido frio e vocês não iriam poder aproveitar as praias. No verão é outra coisa e tem tanta praia e lugar lindo em Floripa, as crianças vão amar.

Vai dar tudo certo e você tem razão: ficar dando murro em ponta de faca é besteria. O letting go foi necessário e sensato.

Beijo grande,

Cris

7:55 AM  
Blogger Andréa said...

Poxa, Regina, sinto muito, mas nem pense em ficar remoendo isso na cabeça e se sentindo miserável. Faz todo o sentido do mundo pensar que realmente não era pra ser. "Há muito mais mistérios entre o céu e a terra..." lembra? Não era mesmo pra vocês irem, está na cara. Fique tranqüila e mantenha a fé. E no ano que vem essa viagem vai ser muito legal, muito esperada e curtida, você vai ver. Um abraço apertado.

5:57 PM  
Anonymous Anonymous said...

Que decepção!!! Eu estaria com muito ódio também. Vou até olhar agora o passaporte do meu filho para ver se está em dia. O brasileiro eu sei que precisa renovar.

Tem saído nos jornais que tá a maior crise no processamento de passaportes americanos, tem muita gente reclamando pela demora e levando prejuízo, como no seu caso.

6:33 PM  
Anonymous Anonymous said...

Regina,
Consigo imaginar direitinho a tua frustração. Apesar de que isso não serve de consolo, eu sei.

Sinto muito.

A.

7:05 PM  
Blogger JAM said...

Que chato!!! Mas sou adepta da filosofia: se nao foi era porquê nao era para ser também. Algumas pessoas consideram isso acomodaçao, eu nao...Acredito que 'existem mais coisas entre o céu e a terra do que sonha a nossa va filosofia...' Espero que ano que vem corra tudo bem com a sua viagem.


Eu também estou há quase 2 anos sem ver minha família e em dezembro vou enfrentar toda burocracia...Já que meu filho nasceu na Bélgica, tem passaporte belga, mas para entrar no Brasil vou tirar o brasileiro e toda novela.

beijinhos para vc e sua família ;)

1:17 AM  
Blogger Regina said...

Queridas Ana Lucia, Cris, Andrea, Leila, Anita e Jamine,

Muito obrigada de coracao pelo apoio e pelo carinho.

Leila, aplique para o passaporte do Cris com bastante antecedencia.

Jamine, o passaporte brasileiro foi barato e rapidesimo. O que me deu problema foi o americano.

Beijocas a todas,

Regina

2:43 AM  
Anonymous Anonymous said...

Nossa Denise! é pq não tinha que ser mesmo.... a burrocracia não perdoa...

Ana Lucia
Na última vez que fui ao Brasil (agora em Maio passado), a cia aérea pediu meu passaporte canadense. Eu tinha mostrado só o brasileiro e a funcionária disse que sem o canadense eu não poderia embarcar. Detalhe: eu não sou obrigada a usar o passaporte canadense para entrar no Canada! Mas cada um interpreta as regras da maneira que entende...

6:15 AM  
Blogger oakleyses said...

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7:10 PM  
Blogger oakleyses said...

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7:23 PM  

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